top of page

SIGA

Café #1


O céu está começando a ficar alaranjado, o que significa que devem ser umas 17h, começa a tocar um jazz bem chatinho e meu cappuccino está bem atrasado, o trânsito de crianças com suas mochilas de rodinha andando de mãos dadas com suas mães e babás começa a ficar mais intenso, algumas senhorinhas passam com seus cachorros de raça pra lá e pra cá na calçada, a cafeteria começa a ficar mais cheia de pessoas que parecem ser importantes (ou pelo menos fingem que são) homens de terno e gravata e moças de saia lápis começam a entrar e sair com copos de isopor preenchidos com todo tipo de café e chá e antes que eu possa me levantar e perguntar pra moça do caixa o que aconteceu com meu cappuccino, ela entra. A pele pálida, o cabelo até a altura do seio com algumas mechas azuis quase verdes, as unhas roídas mas pintadas por um esmalte escuro que não consigo decidir se é azul ou roxo, e quando vejo, ela está prendendo o cabelo num desses coques esquisitos no topo da cabeça, e meu deus, que nuca, nunca fui de reparar na nuca das pessoas, mas aquela era uma nuca bonita. Ela está sentada numa mesinha perto da janela num canto iluminado da cafeteria, eu levanto e vou falar com ela, porque como ignorar uma garota dessas? Pergunto se posso me sentar, ela diz que sim, eu pergunto o nome dela e a resposta vem numa das vozes mais lindas que já ouvi, "Ana". A gente conversa sobre todo tipo de assunto, ela é viciada em filmes e ama ler biografias, eu reparo numa mancha laranja no dorso da mão direita e ela segue meu olhar, então me conta que um dos hobbies dela é pintar. Ana gosta de pintar nessa época do ano porque tudo fica em tons de marrom; amarelo e laranja, é claro, é frio e as pessoas andam bem vestidas, o vento sopra de forma que ela possui a liberdade de pintar formas não tão certinhas. Ela me mostra um desenho que anda trabalhando enquanto a garçonete coloca na mesa uma caneca de chá de maçã com canela na frente de Ana e o meu cappuccino (finalmente). Conversamos mais um pouco e peço o número dela. Depois de uma semana saímos, o primeiro beijo acontece (e tinha gosto de canela, juro), e quando me vejo, estou completamente apaixonado por ela, passa o outono, o inverno e a primavera, chega o verão e as formas dos desenhos e pinturas de Ana são mais certinhos.Ela é diferente, sabe? Sem ser previsível. E linda, a cada dia que passa, percebo o quão linda ela é por dentro e por fora. O outono volta e estamos sentados na mesma mesa do cantinho da cafeteria onde nos encontramos pela primeira vez e eu a peço em casamento. Ana e eu nos casamos em uma dessas capelas pequenas, numa quinta-feira fria de março com todos os tons de amarelo, laranja e marrons que se tem direito, estamos saindo do altar e os sininhos da igreja começam a tocar assim como o sininho da cafeteria toca quando vejo a moça do cabelo azul saindo com seu copo de isopor preenchido com um líquido que não faço ideia do que seja, já que estou ocupado perguntando à moça do caixa o que aconteceu com meu café.


  • Facebook Clean Grey
  • Twitter Clean Grey
  • Instagram Clean Grey

POSTS RECENTES: 

PROCURE POR TAGS: 

Nenhum tag.
bottom of page